Meus dias na quarentena

Autora: Carla Sittoni
Componente: Língua Espanhola

 Meus dias na quarentena

 Logo que a pandemia chegou, dei minhas últimas aulas com um pouco de apreensão, medo do que viria, mas, ao mesmo tempo, um pouco de alívio. Pode parecer absurdo, mas sim… alívio.

Alívio porque eu e meu marido estávamos numa corrida frenética para dar conta de tudo. Ele trabalhando 60h e eu 40h me dividindo entre Viamão e Poa e, o que mais me dava angústia, o Matheus. O Matheus saía às 6h30 de casa para casa de alguma das avós porque fazíamos revezamento de avós durante a semana, cada dia numa. O primeiro que chegasse em casa o buscava, no caso, geralmente eu, pois o Tiago dava aula até às 22h30. Além disso, nos fins de semana, sempre tinha algum evento (nós temos famílias grandes e unidas que adoram uma junção, além dos amigos), não ficávamos nunca em casa, nem sábado nem domingo.

Então, primeiro pensamento, apesar do medo e da angústia de tudo que acontecia, foi que era bom ficar um tempo juntos, curtir o pequeno e colocar em ordem várias coisas, principalmente meu caderno de receitas (uma das coisas que mais gosto de fazer, cozinhar).

Os primeiros dias foram bons, pois diminuímos nosso ritmo de trabalho e, claro, o Matheus não deixa ninguém entediado. Mas, ao mesmo tempo, não estávamos acostumados a ficar em casa longe de nossas famílias e isso não estava bom.

O Matheus tem uma energia que não sei de onde tira. Não para nunca e não nos deixa parar também. Não podemos desgrudar os olhos dele um minuto que faz alguma coisa (sobe no sofá, risca as paredes, tira os fios das tomadas…). Então resolvemos fazer uma cerca para ele não cair no pátio – na parte de trás da casa tem um pátio e um muro que não tinha proteção. Onde ele adorava brincar? Ali… corria como se fosse se atirar só para nos ver correr atrás dele e dava risada. Então, Tiago fez uma cerca para colocar ali e na escada colocou madeiras do lado pare ele não cair e uma portinha. Como temos um cachorro, ele deixou um espaço pequeno para o cachorro passar, no primeiro degrau. Matheus, muito esperto e observador, viu o cachorro passar pelo buraco uma, duas vezes, o que ele fez então? Passou pelo buraco do cachorro… demos algumas risadas que o guri tinha vencido o pai. Tiago, para não ficar para trás, teve uma ótima ideia, fez uma portinha nesse buraco que levanta e baixa, para o Matheus não fugir mais… pronto, agora está resolvido, disse ele. Matheus foi ali, olhou, olhou, pegou os carrinhos que tinha nas mãos, jogou na escada e foi se espichando e entrando no buraco do degrau de cima e foi indo até que conseguiu “buscar seus carrinhos”. Ganhou mais uma vez, kkkk. E isso, embora muito cansativo, é ótimo porque mostra que está se desenvolvendo muito bem.

Mas essa tranquilidade foi só na primeira semana, depois começamos a preparar aulas e isso foi desesperador. Tanto eu como o Tiago temos muitos níveis e tínhamos muitas atividades para planejar e de uma maneira muito diferente de antes. E o Matheus não queria saber, precisava de atenção e chorava e nos puxava e tínhamos que terminar… as 3 primeiras semanas foram enlouquecedoras e me sentia culpada por não dar atenção e uma angústia em conseguir dar conta de todas atividades, correções, e-mail para responder, descobrir como gravar aulas e utilizar novos recursos… já estava pirando.

Eu penso que sempre devemos nos adaptar da melhor forma possível e, apesar de trabalhar muito, mas muito mais que antes, tenho um marido que me ajuda em tudo (às vezes acho que faz mais do que eu em casa) e um menino encantador, cheio de energia que tem um sorriso cativante e que quando paro de trabalhar pega minha mão e me puxa para mostrar alguma coisa e conversa (na língua dele). E quando nos deitamos, eu exausta do dia, ele sobe na minha barriga diz “alo” (cavalo) conta “um, duuuu com o dedinho levantado” e quer que eu faça ele saltar e depois junta as mãozinhas, faz “ão” (coração) me dá um abraço sorrindo e beijo (certa vez li que devemos fazer códigos com as crianças e eu fiz o do coração. Quando faço coração com a mão é porque quero um abraço e beijo). E, ali, tenho minhas energias renovadas e meu coração se enche de amor e de esperança de que tudo isso vai passar e que eu só posso agradecer pois tenho a melhor família do mundo.

 

Chayele: Diário de uma quarentena
Quarentena : a hora de aprender a viver.